Nos últimos doze anos, Bruno não dormiu mais do que cinco ou seis horas por noite, mas na última semana é que as coisas ficaram feias de verdade. Passara toda a noite de segunda no escritório, e não dormira mais do que três horas na terça. Na quarta, a mesma coisa e, na quinta, enquanto arrumava a gravata às quatro da madrugada, ainda mole e dormitando, ainda com os olhos ardendo e pesando e com o cabelo todo arrepiado do banho que não valeu (porque todo mundo sabe que banho de manhã tem função mais de despertar que de limpar), para ir novamente trabalhar, ele reparou com desgosto nas olheiras fundas.
Além disso, não se lembrava de jamais ter sido tão magro quanto àquele ponto. Pudera, não tendo mais tempo para comer direito e se limitando a qualquer porcaria uma vez por dia. Por fim, conforme já saía do banheiro e da casa, agora acordado, e entrava no carro correndo e correndo batia a porta e acelerava sem nem ter posto o cinto ainda e saía no escuro, pensou em quanto estava pálido, ficando de noite a noite trancafiado, vendo o sol pela janela, quando muito.
Mas a vida é assim, e a empresa estava crescendo e tudo mudaria em breve, e ele até poderia tirar férias. Talvez.
No entanto, à tarde sua barriga doía, e quando ele se levantou para tomar um café, sentiu uma tontura que quase o desequilibrou, e bambeou bambeou, e se apoiou na própria mesa. Porém, acabou derrubando os lápis e livros e coisas, e a mão escorregou e ele quase tomba, mas se segura. Pálido, pálido, os olhos afundados e a barriga vazia, levantou de novo e foi meio escorado em direção ao banheiro, mas no caminho havia a janela, e quando tropeçou bambeou, tombou e só sentiu o vidro cedendo ao empurrão e a janela abrindo e o vento vento vento ven...
E foi então que Bruno virou um morcego e voou dali.
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