Pôs uma perna para fora do trem e percorreu toda a estação com os olhos, antes de sair por completo. Depois, abaixou o chapéu para que lhe cobrisse o rosto e seguiu em passos firmes pela noite deserta. Sentia o calor dos bolsos da casaca de couro bege e ouvia somente o som quase imperceptível das pisadas das botas pretas, pontudas e ágeis que os pés vestiam.
Dobrou uma esquina, espantando um gato e se lamentando em pensamento quando o bichano derrubou uma tampa de lata de lixo, rompendo o silêncio até então absoluto. Sentiu o vento frio no rosto e seguiu adiante.
Depois de alguns minutos de caminhada rápida, mas não apressada, chegou à ampla praça que faz frente ao casarão. Não havia nenhuma iluminação artificial, e a lua dava um tom pálido ao gramado deserto, em que balanços rangiam em suas correntes, movidos pelo vento ou por algum espírito qualquer.
Ele encarou longamente o portão enferrujado, que jazia entreaberto e depois o escancarou com um empurrão. O rangido se estendeu pela noite, mas o barulho já não o importava, conforme enfiava mais profundamente a mão no bolso e sentia o toque frio do metal.
Avançou pela trilha de pedras que levava até a porta da mansão e tocou a campainha. Sem nenhuma ansiedade, observou enquanto a única luz acesa, no quarto mais alto da casa, apagou-se e foi seguindo de janela em janela até descer as escadas e chegar ao salão principal.
Quando a porta se abriu, revelando o morador do edifício -- um velhinho franzino e recurvado, que vestia um robe de seda e chinelas --, ele inclinou-se em cumprimento educado e pediu a gentileza de entrar. O velhinho concedeu e é improvável que tenha notado a sequência de ações que se seguiu, quando uma mão ágil saiu do bolso do visitante carregando a navalha e sangrando-lhe o pescoço. O dono da casa caiu já morto, mas o assassino não procurou por jóias ou dinheiro nos móveis indefesos.
Durante as horas seguintes, limitou-se a fitar a lareira, enquanto esperava por quem lhe pagaria pelo serviço.
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