quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Quando eu vi o mar, era o último dia do ano e de dezembro. Havia duas meninas atrás de mim, eu não as via porque elas estavam atrás de mim, mas eram duas meninas porque tinham vozes de meninas, e elas falavam comigo mesmo sem eu as estar vendo. Uma me dizia: "Marina, olhe lá, um navio", e eu me divertia porque não me chamo Marina, me chamo José, e não sei por que ela me chamava assim (devia ser porque eu não havia dito meu nome de verdade), mas ainda assim eu olhava e via o navio e era bonito, mesmo, vê-lo assim, refletindo o resto de luz do sol. A outra, tadinha, era ainda mais confusa, dizia: "É mesmo, Alice, e logo ali vai outro", e eu fazia esforço pra não rir, que também não chamo Alice.
As duas ficaram horas e horas, ali, me dizendo as coisas mais absurdas sobre o céu e sobre como em breve haveria fogos e sobre como o tempo estava bom. Conforme a praia enchia, mais gente se apertava na areia, algumas à minha frente, de costas, outras dos meus lados ou do lado das duas meninas que falavam comigo. Essas outras pessoas também me diziam todo tipo de coisa, me diziam "Olha, mãe (mas eu não sou mãe de ninguém, é claro), um passarinho (mas era um morcego, mas quando os morcegos voam bem depressa, no escuro, quem poderia dizer que não são passarinhos?)", ou "Aqueles bolinhos, juro por Deus, não me fizeram bem", ou até "Me dá mais um pouco dessa cerveja", embora eu não tivesse cerveja nenhuma, não soubesse de bolinhos nenhuns, então eu ria, ria.
Acho que foi a melhor noite de 31 do mundo, com tanta gente ali, e eu só fiquei triste por um minutinho, quando alguém disse "Olha ali, um velhinho rindo sozinho", e eu fiquei chateado de pensar nesse velhinho, coitado, sem ninguém pra falar com ele como todo mundo falava comigo.

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