Eu devo estar errada. Não seria a
primeira vez e, se for o caso, também não será a última, pois
haverá ainda um erro a cometer. É por isso que escrevo para
ninguém, porque sei que não interessam a ninguém os meus erros, os
sofrimentos que eu acho que me afligem quando na verdade --- na
verdade há um planeta inteiro povoado por bilhões de corações,
todos eles se apertando à noite e impotentes demais para fazer
qualquer outra coisa que não torcer para que um novo dia lhes
amanheça.
É injusto pensar que somos iguais e é
mais injusto pensar que somos diferentes: que eu sou algum tipo de
exceção ou que as feridas dóem mais em mim ou que quando me deito
à noite --- e minha cama é macia e minhas cobertas são quentes e
minha barriga não dói --- estou mais sozinha que qualquer outra
dessas almas. Não importa o que eu faça, não posso me livrar da
injustiça --- mil passos desse: mil passos apenas --- e então eu me
sei errada, engasgo, mas não consigo afastar o gosto salgado das
lágrimas.
Eu sei que estou sendo ridícula. É
por isso que escrevo para ninguém, porque já não me faltam
acusações de exagero e de egoísmo. Poupe-as, se puder, mas não se
esforce muito: elas não me virão como nada de novo e não agravarão
em nada as minhas hiperbólicas reclamações.
Às vezes, me ocorre tomar uma
machadinha em mãos e fazer por merecer o tratamento especial que
tanto me dedico. Dar-me uma razão para sofrer, para não precisar
sofrer sem razão. Não precisar me desculpar constantemente, nem
precisar me calar.
Mas tanto faz; há ainda um erro a
cometer, se eu estiver errada. Ou então estaremos todos perdidos,
quem sabe? E, a quem olhar de muito perto, ou então de muito longe,
não haverá diferença entre a minha dor e a dos que sofrem mais e
com mais merecimento do que eu. E então estaremos livres para
sofrermos como quisermos, imagine. Se assim for, talvez vocês me
perdoem.
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