terça-feira, 16 de outubro de 2012

Mar, 16

A portuguesa terminou sua história e imediatamente retornou ao silêncio de antes, olhando calmamente para o mar distante, embora a noite já tivesse se fechado, impedindo que se visse qualquer coisa. Durante algum tempo, eu não pude fazer mais do que acompanhá-la, mudo, enquanto pensava no que ela me havia dito. Eu havia escutado a tudo com grande naturalidade e, mesmo depois, não duvidava de nada. Imagino, é claro, que a coisa toda pareça absurda a quem lê este diário, mas qualquer um que ouvisse a história da boca de Maria saberia que aquela só podia ser a verdade.
Na verdade, naquele momento, eu sequer sentia haver razão para estranhamento. Apenas levantei-me, portanto, e saí arrastando os pés em direção à casa em que estava hospedado, ouvindo o ruído das ondas e pensando na enorme tristeza que me havia dominado.
No dia seguinte, quando o sol se pôs, quis me distanciar das ruas por onde costumava passear e deixei que meus pés cuidassem de me levar para onde bem entendessem. Havia tanto de extraordinário naquela ilha que eu me sentia seguro de que, fosse aonde fosse, acabaria por me deparar com algo que me valesse a noite. E não havia andado por mais de quinze minutos quando algo me chamou a atenção.
Alguns metros à minha frente, dois homens tentavam consolar um terceiro, que urrava aos prantos. Este se contorcia, gritava e dava murros no chão, num desconsolo absolutamente teatral, mas a situação ganhava ares cômicos, mesmo, pelo fato de o chorão ser um homem gigante, decerto acima dos dois metros de altura e não muito menor de ombro a ombro.
Seu rosto enorme parecia uma ilha, perdido em meio às ondas de seus cabelos compridos e barba desgrenhada, e ele repetia insistentemente as mesmas palavras, que mais tarde descobri serem um nome: Maud Thyra.
Como não entendesse o que ele dizia, me aproximei de um dos homens que o acodiam e que falava um inglês curioso, mas razoavelmente compreensível. Perguntei por quê o homem chorava, e ele me disse que esse espetáculo tragicômico se repetia todos os anos, no equinócio.
A resposta, é claro, apenas aumentou minha curiosidade, de forma que o pressionei para que falasse mais. O sujeito não apresentou muita resistência. Sentou-se em um muro e, balançando alegremente as pernas, contou-me a história do grandalhão.

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